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Textos de amigos e músicos do artista.

Bossa-Nova-Nova: Edu Lobo (2)

Vinícius de Moraes

Pouco depois do nosso conhecimento, em fins de 1962, Edu Lôbo um dia apareceu na minha casa para pedir-me a contracapa do seu primeiro disco: um “compacto” feito na “Copacabana” – e por sinal pìfiamente – com arranjos, se não me engano, de Pachequinho. São sambas ainda “nas fraldas”, mas já indicativos do compositor cheio de bossa que dêles deveria despontar com fulminante rapidez.

A partir do carnaval de 1963, num período de festinhas ininterruptas em que realmente se deu o encontro dos “grandes” da bossa-nova com os seus jovens epígonos, Edu Lôbo fêz-se logo notar por Tom, Carlinhos e Baden pela seriedade de sua composição. Em meio ao roseiral de brotos com que andávamos de casa para casa, seu violão era obrigatório. Edu destacava-se pelo comportamento impecável, pela discrição nas palavras e por uma simplicidade e modéstia naturais, mas não isentas de uma certa segurança e orgulho. Um grande garôto. Nos conquistou ràpidamente a todos.

Mais tarde pouco antes da minha partida para a Europa, em setembro de 1963, Edu Lôbo conheceu o cineasta Rui Guerra, com quem eu, desde 1960 me ligara de amizade depois de uma tentativa (fracassada) que fizemos de arrancar um filme do romance “Riacho Doce”, de meu querido e saudoso amigo José Lins do Rêgo. Rui é um homem superinteligente, talvez até por demais inteligente, e com uma grande (e em alguns pontos para mim errada) sensibilidade para a música. Um místico da terra, se podemos dizer assim, Rui animou-se com as primeiras tentativas de Edu Lôbo de “desatomisar” o samba moderno, injetando-lhe um pouco de afro, um pouco de gleba e um pouco de clássico. A terrível influência de Tom provocava as primeiras reações: reações naturais, porque melhor do que Tom ninguém podia mesmo ser. Tratava-se, para os novos, de libertar-se da fatal poesia que transpirava da música de Antônio Carlos Jobim: ou estariam êles fritos. E Edu reagiu. Se os resultados que apre-senta são alguns, animadores, outros deixam muito a desejar. Não me pare-ce que o afro seja um elemento espontâneo na música de Edu Lôbo, nem a terra, como na música de Baden. O clássico, sim Edu já parte para a mú-sica como um jovem clássico: uma pro-fundidade temática, uma altitude de conceituação musical realmente raras num rapaz de 21 anos. Seus “motivos” soam às vêzes como os de um jovem Beethoven. Há uma espécie de “religiosidade” em sua estruturas. Talvez – é difícil dizer ainda – seja êsse o seu caminho. Os seus sambas “de terra” podem constituir uma experiência interessante, mas não me parecem o melhor que tenha a dar. Mas mesmo dentro dessa linha já nos tem êle apresentado, com letras de Rui Guerra, sambas de grande qualidade, como “Canção da Terra”, gravado por Nara em seu primeiro LP, e “Reza”, que faz parte de sua nova “bolacha” neste momento em gravação. “A Música de Edu Lôbo por Edu Lôbo”.

Edu está, atualmente estudando piano com Wilma Graça e pensando seriamente numa bôlsa de estudos para algum lugar onde possa desenvolver seus conhecimentos de música. Nada mais justo. Eu vejo seu caminho brilhante, pois talento não lhe falta. Acho só que êle precisa sacudir um pouco a maquilagem de terra que Rui lhe passou em cima, porque êste sim! – êste é um cineasta danado de bom!

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