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Textos de amigos e músicos do artista.

Bossa-Nova-Nova: Edu Lobo (1)

Vinícius de Moraes

Se alguém me dissesse, mesmo de brincadeira, que eu viria a fazer música com o filho de meu velho amigo Fernando Lôbo, eu cairía para trás. Trinta anos nos separam em idade e experiências; e no entanto quando o meu mais jovem parceiro chega hoje em dia em minha casa, manda a sua brasa no violão e eu ponho letra no que êle faz; quando êle acha que a coisa não está cem-por-cento e me sugere uma segunda tentativa; quando êle me diz dos seus planos, de sua vontade de ganhar a parada com a música, pela qual largou tudo, – eu me sinto tão renovado, tão dentro da jogada, tão jovem quanto êle. Aí tenho vontade de ligar para o Lobinho (que é para mim o pai) e (dizer-lhe: “O pernambucano da peste! Por que é que você parou de fazer música, você que escreveu letras tão bonitas para Paulinho Soledade e outros parceiros? Por que é que você não procura mais a mocidade que continua latente dentro de cada homem? Pare de examinar o tamanho de sua barriga, pegue no papel e lápis e conte a sua histórinha também, que êste seu amigo aqui está precisando de socôrro urgente, pois já-já, de tanto trabalho, vai começar a bater pino!” E que beleza não seria um samba Edú Lôbo com letra de Fernando Lôbo!”.

Edú Lôbo fêz apenas 21 anos – maioridade que comemorou devidamente, com uma festa cujos ecos me chega-ram em París – mas é dos “três, gran-des” novos, o mais sério, o mais imbuído da sua, missão de músico; e não que Francis Hime e Marcos Vale não sejam também; é que Edú Lôbo, mais na linha de Carlos Lira, acentua essa impressão através, do seu comportamento externo. Também Carlinhos, entre os “monstros sagrados”, revela muito maior aplicação no que faz, é mais estudioso, sistemático, disciplinado. E à medida que eu penso no assunto, mais essa similitude artística entre os “binômios” Tom-Francis Hime, Carlinhos Lira-Edú Lôbo e Menescal-Marcos Vale adquire foros de verdade. Os estilos são próprios, sem o que não haveria originalidade, mas as músicas são afins. Os primeiros são mais “céu”; os segundos são mais “terra”; e os terceiros são aquêles a quem Terpsicore deu a mão: mais “leves”, folgados, dancáveis. Poder-se-ia dizer também que Tom e Francis são mais “puros”; Carlinhos e Edu mais “humanos”; e Menescal e Marquinhos mais “alienados”, para não dizer abstratos”.

Edu Lôbo começou a pegar no violão há uns cinco anos apenas, e hoje em dia é dos que melhor toca o instru-mento entre a garotada da bossa-nova, com uma boa rítmica e harmonias enxutas: um violão simples, bem a serviço da música, como é, também, o caso de seu “símil” Carlinhos Lira. Filhinho de peixe, começou desde logo a se interessar pelo nosso movimento renovador, do que resultaram uns sambinhas que êle “acha melhor esquecer”. Uma noite em Petrópolis, em casa de Olivinha Leuenroth, quando o conheci, êle me tocou um sambinha danado de bom. Fiquei ouvindo e ouvindo e, a horas tantas, saíu uma letrinha:

Não sei se foi um mal,
Não sei se foi um bem,
Só sei que me fêz bem
Ao coração.

Sofri, você também,
Chorei mas não faz mal,
Melhor que ter ninguém
No coração.

Foi a vida,
Foi o amor quem quis,
É melhor viver
Do que ser infeliz…

Foi tudo natural,
Ninguém foi de ninguém,
Mas me fêz tanto bem
Ao coração.

O sambinha, que foi recentemente gravado com o titulo “Só me fêz bem”, pela cantora Vanda, em seu primeiro LP, invoca muita gente com aquêle: “É melhor viver/ do que ser feliz…” Tom me contou que nos Estados Unidos, então, os letristas e editôres ficam escandalizados. Êles gostariam que fôsse: “É melhor viver/ e ser feliz…” O que mostra a que ponto chegaram as coisas por aquelas bandas.

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